Compulsão por Jogos

missing image fileJogar é tão comum no cotidiano quanto respirar. No entanto, existem componentes no jogo, e em certos jogos, que podem extravasar para o descontrole da vontade do jogador. Por isso, o jogo é hoje uma realidade que merece uma reflexão especial quanto ao seu potencial para criar dependência.

O “jogo”, como atividade recreativa ou de exploração e construção de relações sociais, permite a descoberta do mundo, o desenvolvimento psíquico-social e biológico do indivíduo. No campo da socialização, o jogo possibilita experimentar papéis sociais, criar coesão social ou marginalização, reforça a identidade ou expõe a marginalidade, num permanente fabrico da teia social na qual se movem os indivíduos. Assim, podemos caracterizar o jogo como uma plataforma para satisfazer necessidades sociais e psicológicas, que dentro dos padrões da razoabilidade, pode desempenhar um papel relevante na sociedade.

O jogo como doença 
A OMS define o jogo compulsivo como qualquer tipo de jogo excessivo que origine perturbações financeiras, sociais e/ou psicológicas.
Desde os jogos de póquer, cartas e dados, aos jogos de computador podem se transformar em doença. Embora não existam estudos que estabeleçam essa relação, não é difícil pensar que longas horas passadas em frente de um computador a jogar jogos de morte, guerra, ou simplesmente inseridos em mundos virtuais, provocará uma alienação acentuada da realidade, dos deveres sociais e humanos, da insensibilidade perante o sofrimento causado pela violência ou pela morte, comprometendo assim a integridade da vida humana no respeito pelas mais básicas qualidades. 


Mas porque é que o jogo se pode tornar uma doença? 
Basicamente pelos efeitos que provoca ao nível do cérebro, ao induzir sensações de bem-estar elevado, gerando incapacidade da pessoa dominar a pulsão para jogar, independentemente das consequências que tal prática possa acarretar ao nível social (família, profissão, lazer), financeiro ou biológico (consumindo as horas do descanso da noite por exemplo).

Impulso para o Jogo
 Temos de distinguir vários tipos de impulsos para o jogo: 
 A que é baseada na emoção da “sorte”. Aqui temos jogos como a roleta. Neste caso, a pessoa sai premiada, o que lhe dá uma euforia e supremacia perante os demais companheiros de jogo. 
 A que é baseada no envolvimento intelectual do jogador, embora a sorte possa desempenhar algum papel. É o caso do póquer, para o qual é preciso astúcia, e a auto-estima saí reforçada perante a superioridade intelectual demonstrada na implementação do jogo. Há um enaltecimento do ego, pois a vitória, para além da sorte, depende da capacidade do jogador. Deste modo, investir cada vez mais tempo e interesse em apurar essa capacidade pode ofuscar todas as outras atividades e responsabilidades da vida. 
 A que é baseada no conhecimento e experiência. Este tipo de jogos (tais como apostas em corridas de cavalos), baseia-se muito no conhecimento que o jogador tem do meio no qual joga, nos profissionais que acompanha vorazmente (por exemplo, equipas de basquetebol ou futebol) e na experiência que anos de perspicaz observação lhe deram. Isto gera uma necessidade interior de apostar e ganhar o generoso prêmio que vem juntamente com a  sensação agradável da vitória. 
Existem “bases” diferentes que conduzem ao jogo compulsivo: da gratificação à recompensa, à supremacia do ego, ao sentido de superioridade intelectual; são vários os caminhos que podem levar os humanos a envolverem-se numa actividade que lhes retira o domínio sobre os outros aspectos da sua existência. 
Estágios do jogador compulsivo 
Há um balanceamento entre três estágios:
  O estágio da euforia de se ser vencedor: muitas vezes, esta fase é “arranjada” pelos organizadores do jogo, que fazem crer ao jogador que ele tem condições para ganhar muito. A pessoa envolve-se cada vez mais. 
 O estágio de perda, que se manifesta pelo aumento progressivo de recursos como o dinheiro ou tempo “gasto” (pois o jogador não assume como “perda”). Estabelece-se um padrão em que o que se ganha é investido em jogar mais. A condição econômica do jogador compulsivo começa a degradar-se.
  O estágio do desespero e esgotamento: a degradação da situação leva o jogador a desenvolver actividades ilícitas para se procurar recursos para continuar a jogar. A família e os amigos deixam de contar, e são muitas vezes usados para garantir meios para continuar a jogar, na esperança de encontrar os recursos para voltar a pagar as suas dívidas, geradas pelo jogo. Desesperados, estes jogadores não querem reconhecer o seu estado e voltam-se contra aqueles que frustram as suas intenções em continuar a jogar. Muitas vezes, o suicídio ou o desaparecimento com mudança de identidade ou de país tornam-se o caminho para sair da crise. Mas existem outras possibilidades de recuperação, que não estas aqui enunciadas.
Como sair deste estado de degradação?
O primeiro princípio que deve ser procurado é o da revalorização do ego desfeito do jogador compulsivo. Para isto, a desmontagem do processo pode passar por um programa de mudança de comportamento que pode ser obtido através de visitas a grupos de terapias comunitárias, consultas psicológicas e médicas, apoio dos familiares e amigos.
A decisão de abandonar a compulsão pelos jogos deve ser tomada pelo próprio jogador, o qual buscará os meios mais favoráveis para adquirir novamente sua vida familiar, social, econômica e biológica.  


Fonte: Revista Saúde e Lar
  
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